quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

RABELAIS E A MACONHA - I

François Rabelais (1494/1553) era filho de advogado e sua família possuía muitos campos onde se plantava maconha. Grande escritor e médico, a obra de Rabelais teve forte influência na formação da França como nação. O século XVI foi importantíssimo para a formação do Estado francês, o maior da Europa à época, tendo a literatura desempenhado um papel fundamental para o estabelecimento de um idioma comum. Em sua obra, com muito humor, Rabelais tecia ásperas críticas ao conservadorismo do clero e da academia, enquanto exaltava os prazeres da vida, tais como o riso, o sexo e a bebida. Em “O Terceiro Livro dos Fatos e Ditos Heróicos do Bom Pantagruel", Rabelais faz lindas descrições da maconha, planta à qual dava o nome de pantagruelion. Dedicados à maconha, ou pantagruelion, estes são os títulos dos quatro últimos capítulos do livro: “Capítulo 49: COMO PANTAGRUEL FEZ OS PREPARATIVOS PARA IR AO MAR, E DA PLANTA CHAMADA PANTAGRUELION; Capitulo 50: COMO DEVE SER PREPARADO E EMPREGADO O CÉLEBRE PANTAGRUELION; Capítulo 51: PORQUE SE CHAMA PANTAGRUELION E DAS ADMIRÁVEIS VIRTUDES DESTA; e Capítulo 52: COMO CERTA ESPÉCIE DE PANTAGRUELION NÃO PODE PELO FOGO SER CONSUMIDA.” O que primeiro se observa da leitura é o cuidado com que se fala da maconha. Sempre de forma mítica, fantasiosa e até alegórica, bem diferente do escancarado tratamento quando se refere à bebida no livro. Embora o autor não deixe totalmente claro que o pantagruelion era usado para fins recreativos, ele dá bandeira no último título. Neste, ao advertir que determinada espécie não pode pelo fogo ser consumida, confessa assim que outras eram fumadas. Em poucas palavras, Rabelais nos dá uma aula sobre algumas formas de preparar e usar a maconha, no primeiro parágrafo do capítulo 50. "Prepara-se o Pantagruelion sob o equinócio outonal de diversas maneiras, segundo a fantasia dos povos e a diversidade dos países, O ensinamento primeiro de Pantagruel foi: a haste deve ser desvestida de folhas e sementes, macerada em água estagnada, não corrente, por cinco dias, se o tempo estiver seco e a água quente; por nove ou doze, se o tempo estiver nublado e a água fria; depois secar ao Sol, depois na sombra excorticar e separar as fibras ( que, como dissemos, consiste em seu maior apreço e valor) da parte lenhosa, que é inútil, a não ser para fazer tocha luminosa, acender o fogo e nas brincadeiras de crianças, encher as bexigas de porco. Dela algumas vezes os gulosos se utilizam, às escondidas, como sifão para sugar e atrair com a inspiração o vinho novo do barril.” Observe que, no final do parágrafo citado, o célebre autor francês fala do uso "escondido". Isso chama atenção para o fato de quê, já no século XVI, a maconha era usada de forma reservada. Vamos continuar o assunto em outro artigo, mas é importante fazer essa citação, pois vários plantadores são presos e a polícia, perícia, Ministério Público e Juízes tratam da questão da plantação para uso próprio com preconceito, sem considerar todo o processo pelo qual ela passa, separada, secada, até ser fumada a flor da planta fêmea. Rabelais, no século XVI, descreveu esse processo numa obra considerada uma das maiores da literatura mundial. Pode-se afirmar que Rabelais está para o idioma francês como Cerventes está para o espanhol. A citação do livro de Rabelais pode ajudar a quebrar preconceitos contra esta planta cassada pelas raízes racistas da nossa história de bases monarquistas e escravocratas. Registrando sempre que a maconha, também chamada de fumo de Angola, foi trazida ao Brasil pelos negros escravizados e degredados da África. ANDRÉ BARROS advogado da Marcha da Maconha Rio de Janeiro, 27 de fevereiro de 2013

LIBERDADE AO RAS DA MACONHA NO BRASIL

Desde 14 de agosto de 2012, um grande líder do uso religioso da maconha no Brasil está preso por tráfico de drogas. Ras Geraldinho, 53 anos, diretor de TV, conselheiro ambiental, primário, com residência fixa, pacifista, sofre prisão processual. Mesmo na absurda hipótese de condenação, em razão de todas as circunstâncias favoráveis, o líder da primeira Igreja Rastafári no Brasil teria o direito à redução da pena e ao regime prisional aberto. Portanto, sua prisão fere mortalmente o princípio da proporcionalidade entre a prisão fechada atual, cautelar, processual, preventiva e a definitiva, que pode ser, no máximo, no regime aberto. Essa prisão é uma violência. A prisão por constrangimento ilegal é também patente, pois Ras Geraldinho está preso há mais de 6 (seis) meses, quando a lei estabelece que a audiência deve ser realizada no máximo 60 (sessenta) dias depois do recebimento da denúncia. O que vem acontecendo já passou dos limites de um Estado Democrático de Direito e agora, ainda mais, com o que estão fazendo com as provas. As testemunhas de defesa de Ras Geraldinho passaram a ser acusadas também de tráfico de drogas. Esta atitude do Ministério Público e do Juiz do caso desrespeita formalmente e no mérito o princípio do devido processo legal. Ao mesmo tempo que impede a igualdade das armas, que é colocar na balança as provas da acusação e da defesa, criminaliza a prova da defesa, antecipando a sentença condenatória. Isso é pior do que acusar uma testemunha, por falso testemunho, antes da sentença. O julgamento é público, porque a sociedade tem o direito de julgar se a Justiça está ou não fazendo justiça. Se você está indignado com esta prisão injusta, denuncie essa violência. Ras Geraldinho mandou esta linda mensagem para todos nós: “Salve todos os irmãos de fé. Jah Rastafari! Eu e eu estamos passando por este momento de provação que deve ser compreendido e analisado com clareza: o sistema está mais violento do que nunca! Quanto mais próxima nossa vitória parece, mais brutal esta máquina de controle, que chamo de ‘real matrix’, se apresenta. Não podemos baixar guarda de maneira nenhuma! Nossa luta é legítima, mas o preço que estamos pagando é alto demais. Venho render minhas homenagens a todos os irmãos que passaram ou passarão pelos porões desta ditadura que nos oprime por lutarmos pelos nossos direitos. Afirmo isto por estar sentindo na pele e na mente. Hoje posso testificar minha condição de prisioneiro político. Infelizmente, a fé depositada por mim na democracia brasileira está extremamente abalada. Brasil, democracia laica de uma figa! Que Jah nos proteja.” Queremos Ras Geraldinho imediatamente livre para que ele expresse seu pensamento com liberdade. O próprio Ministro Celso de Mello do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Marcha da Maconha, já havia apontado a importância do tema em seu voto-relator e o gostinho de nossa possível vitória final: “Cumpre referir, no entanto, ainda que para efeito de mero registro, que, no Brasil, esse tema – envolvendo o uso ritual, em celebração litúrgica, no contexto da cerimônia religiosa (como as do Santo Daime, União Vegetal e Barquinha), da Ayahuasca ou Huasca (bebida com efeitos psicoativos) – constitui objeto de apreciação pelo Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas, que considerou legítima a utilização religiosa de tal substância, havendo estabelecido, em ato próprio, que o “seu uso restrito a rituais religiosos, em locais autorizados pelas respectivas direções das entidades, usuárias, vedado o seu uso associado a substâncias psicoativas ilícitas” (Resolução CONAD nº 1/2010). Toda liberdade ao milenar uso religioso da erva da paz. ANDRÉ BARROS, advogado da Marcha da Maconha Rio de Janeiro, 20/02/2013

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Planta na Mente: quarta-feira de brasas Por Dr. André Barros

Participei do encontro que decidiu, pelo voto da maioria, o nome Planta na Mente para o primeiro bloco do Rio de Janeiro que defende a legalização da maconha no Brasil. Em 2011, logo no primeiro ano do desfile, tivemos de enfrentar a proibição da guarda municipal que, depois de muita discussão, confessou estar cumprindo a ordem da Comissão Drogas da Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro. Como os mandantes não estavam presentes, fizemos um acordo e desfilamos até metade do trajeto. No ano seguinte, sambamos, sem problemas, dentro do calendário oficial da Prefeitura, por toda a rua Joaquim Silva, na Lapa. Neste ano, fomos colocados no calendário da Prefeitura na mesma data, quarta-feira de cinzas. Mesmo em cinzas, o bloco da maconha carioca vem encontrando dificuldades em desfilar. O corpo de bombeiros indeferiu a saída de nosso bloco em razão do carro de som. Nosso desfile, completamente da paz, vem, novamente, encontrando dificuldades em passar pela avenida do Selarón. Trata-se do racismo de nossa monarquia escravocrata, contra os negros que trouxeram a maconha para o Brasil, acumulado aos libertários anos da juventude branca dos anos 60, que enfrentaram o biopoder no Brasil. É preciso colocar um parágrafo para enfatizar que não somos o primeiro bloco do Brasil a defender a legalização da maconha. Há mais de 40 anos, na maravilhosa cidade pernambucana de Olinda, desfila o bloco “Segura a Coisa”, que apresenta um “baseadão” como sua alegoria libertária da legalização da erva de Jah. Às vésperas do desfile, o corpo de bombeiros apresentou várias exigências ao Planta na Mente, impossíveis de serem cumpridas em tão pouco tempo, objetivando certamente impedir o desfile do nosso bloco. A maior delas é relacionada ao nosso pequeno carro de som. Mas, sendo necessário, não precisamos tanto desse aparelho e vamos desfilar com a força de nosso canto coletivo no gogó. Pensam que vão nos calar, mas não conhecem a força de nossa canção, evolução e harmonia. Pensaram em nos incinerar numa quarta-feira, que de cinzas, Jah transformamos em quarta-feira de brasas. Então, vamos lá, irmandade, lotar nossa luta e mostrar toda a nossa potência aos invejosos, que buscam estragar nossa alegria! Será na próxima quarta, 13 de fevereiro de 2013, às 4:20 da tarde, na escadaria do imortal Selarón, que vamos arder em brasas nossa quarta-feira de cinzas! ANDRÉ BARROS, advogado da Marcha da Maconha Curta André Barros no Facebook: http://www.facebook.com/advogadoandrebarros

Adv.André Barros