Assisto à novela `Amor e Revolução` desde o primeiro capítulo. De cara, gostei do estilo próprio do autor. Depois do abaixo-assinado do clube militar pedindo a interrupção da novela, assistí-la tornou-se um ato político. Parabéns à Procuradoria da República que nem tomou conhecimento do documento protocolado pelo clube militar querendo a volta da censura.
Desde o início, desconfiei que a personagem principal era inspirada na minha tia. Como a atriz, tia Verinha era linda e tinha a convicção e a coragem dessa personagem. Mas duvidei, pois, embora meus avós maternos fossem também de classe média, a história da família é bem diferente.
Ontem, 18 de maio de 2011, no programa 'Sem Censura', minha tia-avó, que não assiste à novela por causa do horário, ouviu a atriz que interpreta a personagem Maria Paixão contar que sua personagem é inspirada em Vera Sílvia Magalhães.
Tia Verinha é minha heroína desde que nasci. Tenho muito orgulho da trajetória de vida da irmã da minha mãe. Quando criança, sabia de tudo que estava acontecendo e tinha de ficar quietinho, doido pra sair contando para o mundo inteiro que minha tia enfrentou a Ditadura Militar brasileira do Império Americano. Que meu pai, Fernando Barros, foi cassado três vezes, tendo sido proibido de ser jornalista, deputado, de votar e ser votado durante 18 anos. Que minha avó foi presa. Contar tudo que minha mãe, Ana Lúcia, e minha tia-avó, Beatriz, me diziam, já que sempre estavam na retaguarda.
Queria contar que participei do sequestro do embaixador americano, Charles Elbrick, em 1969. Com apenas 19 anos, minha tia me levou para a primeira abordagem do levantamento. Nova, inteligentíssima, muito culta, linda e corajosa, tia Verinha se fez passar por minha babá, circulou pela rua do embaixador, em Botafogo, e ganhou a confiança do segurança da casa. Costumo dizer sempre, brincando, que sou o guerrilheiro mais novo da história do Brasil e o principal agente do sequestro, pois, sem minha participação, o segurança nunca iria acreditar que tia Verinha era uma babá. O disfarce foi perfeito. Tia Verinha dizia que não me levaria para uma ação tão perigosa mais de uma vez. No dia seguinte à primeira abordagem, foi sozinha, quando o segurança colocou tia Verinha dentro da casa do embaixador e ainda a apresentou ao chefe da segurança. Assim, foi feito todo o levantamento: o segurança mostrando que sabia tudo da vida do embaixador, entregou todos os seus passos, a fim de conquistar aquela linda jovem. Tia Verinha contou para os companheiros que era facílimo realizar o sequestro do embaixador americano. Os companheiros fizeram uma campana para confirmar as informações da única mulher nesta ação armada.
Banida do Brasil, na Alemanha, tia Verinha usava o falso nome de Elisa e eu não errava: na rua, sempre a chamava de Elisa e, em casa, de tia Verinha. Sempre quis contar, sempre quis que todos soubessem da nossa história.
E agora, na linguagem mais popular brasileira, a telenovela, a história do Brasil está sendo mostrada. Foi sensacional ter a confirmação de que a personagem principal é inspirada na minha tia Verinha. Quanto orgulho de ser sobrinho de uma mulher que arriscou sua vida pelo sonho da democracia real. Que mesmo após ter sido torturada por mortos-vivos que não suportam a felicidade, não queria vingança, mas o reconhecimento de que a tortura foi uma política de Estado, da Ditadura golpista. Eu te amo, tia Verinha.
ANDRÉ BARROS